Publicidade

 

 
 23/12/2019    06:31hs

Ex-presidente de cooperativa de árbitros fez saques diretamente de conta da FERJ

Valores chegam a quase 500 mil. Entidade diz que foram "despesas de arbitragem". Endereço da Coopaferj era usado por mais de duas mil empresas

 
Polícia Civil e MP investigam a cúpula da arbitragem carioca
Publicidade

Por Fred Justo, Thayuan Leiras e Vicente Seda — Globo Esporte Rio de Janeiro

A Operação Cartão Vermelho, deflagrada na última quarta-feira pelo Núcleo de Lavagem de Dinheiro da Polícia Civil, traz à tona movimentações suspeitas que podem confirmar o vínculo entre a Cooperativa de Árbitros de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (Coopaferj) e a Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (Ferj). Diversos saques, somando quase R$ 500 mil, foram efetuados este ano por Messias José Pereira, ex-presidente da Coopaferj.

Ele é acusado no relatório policial de ser "testa de ferro" de Jorge Rabello, ex-chefe da comissão de arbitragem e do Sindicato dos Árbitros Profissionais do Estado do Rio de Janeiro (Saperj).

- Não havia um motivo para ele efetuar saques da conta da Federação. Nós acreditamos que o Messias efetuava os saques da Federação a mando do Jorge Rabello.

Jorge Rabello, ex-chefe da arbitragem do Rio de Janeiro — Foto: Vicente Seda/GloboEsporte.com

A reportagem do Esporte Espetacular teve acesso ao relatório do antigo Coaf, atual Unidade de Inteligência Financeira. Ele mostra que Messias fez quatro saques em espécie, todos com valores altos que, somados, chegam a quase R$ 300 mil. A Ferj alega que os saques foram para despesas de arbitragem. Em nota oficial, a entidade revela ainda outras retiradas, um total de sete cheques, totalizando R$ 496 mil

Esses saques foram efetuados antes de Rabello ter sido supostamente afastado da comissão de arbitragem. Em abril deste ano, após denúncias feitas pelo Esporte Espetacular de desvio de recursos e uso de cartões corporativos para pagamento de gastos pessoais, a Ferj anunciou uma reestruturação na área de arbitragem.

Documento obtido pela Polícia Civil mostra quatro saques de Messias diretamente da conta da Ferj — Foto: Reprodução

Foi criado um departamento, sob a direção de Luiz Mairovitch, com José Carlos Santiago à frente da comissão de arbitragem e Rabello limitado a coordenar a área de desenvolvimento e planejamento. Santiago era o vice de Rabello na comissão de arbitragem.

Sauvei Lai, promotor do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MP-RJ), acredita que Rabello, apesar de oficialmente afastado, ainda dava as cartas na comissão de arbitragem.

Jorge Rabello é detido por posse ilegal de arma de fogo após busca em sua residência — Foto: Vicente Seda / GloboEsporte.com

Após o início da Operação Cartão Vermelho, a Ferj divulgou um documento no qual Mairovitch acata um pedido de licença de Rabello até que os fatos fossem esclarecidos. Horas depois, a Ferj publicou um novo documento em seu site comunicando a exoneração definitiva de Rabello.

Messias e Rabello, além de Sérgio Mantovani, ex-contador da Coopaferj, foram abordados por agentes em seus respectivos endereços na manhã de quarta-feira. Documentos, equipamentos eletrônicos e celulares foram apreendidos e o sigilo fiscal e bancário dos três foi quebrado.

A polícia aponta em seu relatório suspeita de evolução patrimonial incompatível com os rendimentos. Rabello, contudo, nega qualquer irregularidade.

- Eu continuo negando e sempre vou negar. Com a quebra dos sigilos a coisa vai ficar bem clara - disse, logo ao ser liberado sob fiança de 10 salários mínimos da delegacia onde ficou detido por algumas horas por posse ilegal de arma de fogo.

Os policiais encontraram uma sala vazia ao verificar a sede da Coopaferj em Saquarema na manhã de quarta-feira. O mesmo endereço é usado por mais de duas mil empresas, algumas delas fantasmas e investigadas pela Operação Lava Jato. Na visão da polícia, a Coopaferj foi criada para tomar dinheiro dos árbitros.

- Os árbitros estavam pagando duas vezes e aqueles que não pagavam à cooperativa não eram escalados para partidas de futebol. É muito provável que ela tenha sido criada para se apropriar de forma indevida desses valores pagos por árbitros do estado.

Messias Pereira (direita) na Ferj ao lado do atual chefe da comissão de arbitragem, José Carlos Santiago (centro) — Foto: Reprodução

Questionado sobre a sede, Rabello alegou ao sair da delegacia que, na época, recebeu orientação para que a empresa fosse registrada em Saquarema por conta da baixa carga tributária, mas não entrou em detalhes. Ele nega qualquer desvio de recurso do sindicato e também que tivesse o comando na Coopaferj.

Mantovani e Messias foram procurados por telefone e pessoalmente, respectivamente, na quarta-feira, mas não quiseram dar declarações.

Confira abaixo a íntegra da nota oficial enviada pela Ferj à TV Globo:

"À TV GLOBO,

Nota emitida pela Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro para a reportagem sobre o Sindicato dos Árbitros e Cooperativa dos Árbitros. A FERJ entende que, dentro do princípio básico do jornalismo e dos editoriais das Organizações Globo – publicado em seus sítios – é necessária a publicação na íntegra com o claro objetivo de esclarecer dúvidas, respeitar o público e não macular nomes ou a instituição. Ciente da compreensão seguem as respostas.

1) A Ferj diz que em Abril afastou o investigado Jorge Rabello da função de presidente da comissão de arbitragem. Mas a Polícia Civil e o Ministério público acreditam que Jorge Rabello ainda ocupa o cargo. Material apreendido na sala da presidência da COAF revelam que Rabello trabalha lá. O que a Ferj tem a dizer sobre a suspeita dos investigadores?

FERJ: Completamente equivocada, mas compreensível se considerarmos a possibilidade do não conhecimento do estatuto da Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro e da estrutura da arbitragem.

Até março de 2019, toda arbitragem estava inserida num único órgão gestor que era a Comissão de Arbitragem de Futebol (COAF) sob a responsabilidade e comando do Presidente da Comissão, no caso o Jorge Rabello.

Na Assembleia Geral de abril de 2019 foi aprovada, por unanimidade, a reestruturação da arbitragem que passou a ser organizada da seguinte forma:

1- EAFERJ - Escola de Arbitragem da FERJ, com a função específica da formação dos árbitros e assistentes e tendo como diretor Carlos Elias Pimentel.

2- Departamento de Árbitros (DA) sob a responsabilidade de um Diretor, Luiz Mairovitch, abrangendo e constituído dos seguintes segmentos, sem nenhuma subordinação ou ascendência entre eles:

2.1- Comissão Operacional da Arbitragem de Futebol (COAF): com competência e função específica de designar as escalas de toda a equipe de trabalho de cada partida, das diversas competições e categorias, e realizar as audiências públicas exigidas para tal, tendo como presidente José Carlos Santiago.

2.2- Comissão Especial de Planejamento, Desempenho Técnico e Análise de Desempenho (CEPDA): com funções específicas autoexplicativas, tendo como presidente Jorge Rabello.

2.3- Comissão de Ensino.

2.4- Secretaria.

3- Corregedoria Geral da Arbitragem (CGA): sob o comando e superintendência do advogado Carlos Oliveira de Abreu, conforme Resolução de Presidência publicada dia 19 do corrente mês.

4- Comissão de Ética a ser constituída.

Observação:

Todo o departamento e respectivos segmentos estão instalados no segundo andar da sede da FERJ, em suas respectivas salas.

Toda documentação inerente e necessária ao exercício das funções das respectivas comissões e segmentos estão disponíveis para consulta e utilização, sem qualquer restrição.

Todos os membros do departamento de árbitros, indistintamente, desempenham suas funções parcial ou integralmente nas dependências do departamento.

Inexiste qualquer dúvida que o Sr. Jorge Rabello compunha e fazia parte da gestão das atividades inerentes à arbitragem, condição exercida e desempenhada tecnicamente com proficiência há mais de 10 anos, até o presente momento em que optou se afastar de qualquer cargo ou função, fato consolidado no dia 18, conforme Resolução da Presidência número 023/19, publicada na mesma data.

Não existe restrição de acesso a qualquer dependência a nenhum membro do departamento.

Entretanto o Sr. Jorge Rabello não ocupava a sala destinada a atual Comissão Operacional de Árbitros de Futebol (cujas funções e competências já foram anteriormente esclarecidas) desde a sua saída desta comissão, por decisão da presidência, conforme RDP número 07/19, mas ocupava e trabalhava na sala destinada à comissão de planejamento, cuja situação faz parte de uma das salas do mesmo espaço físico de um andar onde estão situadas as demais dependências do Departamento de Árbitros (DA), fato do conhecimento e comprovação por todos os 340 profissionais que compõem a relação de árbitros e assistentes, bem como por qualquer dos nove instrutores e demais membros dos diferentes segmentos da estrutura do DA.

Desde a extinção da antiga COAF (Comissão de Arbitragem de Futebol) por força da reestruturação do DA, aprovado na Assembleia Geral da FERJ, órgão colegiado máximo da entidade, realizada em 12 de abril de 2019 e colocada em prática por decisão da presidência em 25 de abril de 2019, conforme resolução publicada na mesma data, que o Sr. Jorge Rabello deixou de ter ingerência ou participação em matéria referente a escalas de árbitros e assistentes.

Assim sendo e finalizando a resposta, podemos afirmar e garantir que as explicações e esclarecimentos traduzem a pura expressão da verdade e acreditamos que tenha servido para esclarecer dúvidas, evitar ilações equivocadas e decisões injustas, amparadas no imaginário e irrealidade.

2) A investigação encontrou movimentações bancárias suspeitas. Um dos investigados, Messias Pereira, efetuou pelo menos 4 saques das contas da FERJ. Tais saques se deram pouco antes de Rabello ser destituído do cargo de presidente da Coaf. Esses mesmos saques foram em espécie e chegam a 300 mil reais. Como o presidente da cooperativa de árbitros efetuou esses saques das contas da FERJ? Por que valores tão altos em espécie? A Ferj diz que não tem ligação com a cooperativa, mas como o presidente da entidade conseguiu fazer os saques das contas da Ferj? Há justificativa pra isso?

FERJ: Assim como na matéria da primeira pergunta, podemos entender a existência de certa lógica na estranheza apresentada, se a entendermos como fundamentada em hipóteses variadas, no imaginário de ilegalidades ou sem os elementos necessários a uma maior clareza que permita a visão da realidade e o afastamento de equívocos, o que nos induz a presumir ser esta última alternativa a mais provável.

Quaisquer que sejam os momentos, ações e fatos haverá sempre uma infinidade de coincidências e simultaneidades com diversos outras ações e fatos, sem que obrigatoriamente existam relações, inter-relações ou nexo causal. Tal colocação refere-se ao questionamento feito sobre alguma relação de saques na conta corrente bancária da FERJ feitos pelo presidente da Cooperativa, dito como tendo sido realizados pouco tempo antes da destituição do Sr. Jorge Rabelo da presidência da antiga COAF e sua respectiva nomeação para presidir a Comissão de Planejamento, Desenvolvimento Técnico e Avaliação de Desempenho, o que afirmamos não haver nenhuma relação entre as situações pelos seguintes motivos:

1- Os saques na conta corrente da FERJ ocorreram nos dias 8, 22 e 27 de fevereiro de 2019, mediante a emissão de 7 (sete) cheques, perfazendo a importância total de R$ 496.336,31, referentes às despesas de arbitragem, contabilizadas nos borderôs das partidas discriminadas e constantes das notas fiscais correspondentes, em se tratando de jogos de profissionais e de notas fiscais relativas às partidas de jogos de amadores, devidamente relacionados e discriminados.

2- Face a alegação da Cooperativa quanto a impossibilidade de movimentação de sua conta bancária e com o objetivo de permitir que os prestadores de serviço (árbitros e assistente) recebessem o que lhes era devido, a FERJ optou pela forma de saldar os débitos através da autorização de saque emitida em favor do Sr. Messias José Pereira, na qualidade de representante da Cooperativa.

3- Tal opção também teve como intenção caracterizar que tais valores, correspondentes às notas fiscais emitidas em favor da Cooperativa, fossem efetivamente a ela destinados, sob a responsabilidade do representante da Cooperativa, vez que no banco, no momento dos saques haveria a imprescindível identificação do apresentante.

4- A troca do Sr. Jorge Rabello de função ocorreu em 25 de abril de 2019, por meio da Resolução nº 007/19 em razão de reformulação do Departamento de Arbitragem aprovado pela Assembleia Geral de 12 de abril de 2019, sem nenhuma relação com qualquer questão relacionada à Cooperativa.

5- A FERJ realizou os pagamentos, por meio de documentação hábil a qualquer identificação.

6- A FERJ tem regularmente registrados esses pagamentos e a que se destinaram, imaginando que também devam, obrigatoriamente, fazer parte dos registros e documentos da Cooperativa.

7- A FERJ atesta que cumpriu suas obrigações de forma documentada, clara e transparente e presume que os vários credores ou beneficiários a quem se destinavam os recursos tenham sido atendidos, vez que não se tem conhecimento de cobranças ou reclamações sobre a falta de recebimento por serviços prestados, principalmente por parte de árbitros.

8- A persistência da impossibilidade de movimentação bancária pela Cooperativa motivou a FERJ a rescindir unilateralmente o contrato que mantinha com a mesma, passando a partir de março de 2019 a efetuar os pagamentos das taxas diretamente aos árbitros e assistentes".

Apitonacional, compromisso só com a verdade!

Publicidade

 

Copyright © 2009     -     www.apitonacional.com.br ® Todos os direitos reservados