Até 1998, diz o presidente da Conmebol, Alejandro Domínguez, a
América do Sul tinha mais Copas do Mundo e mais títulos
intercontinentais de clubes que a Europa. Isso aconteceu, ele diz,
"porque a Uefa trabalhou, priorizou o futebol", enquanto a Conmebol
"priorizou o dinheiro".
– Isso mudou – disse o dirigente em entrevista ao GloboEsporte.com e
ao SporTV em Manama, no Bahrein, onde participa do congresso anual
da FIFA.
Na entrevista a seguir, Domínguez garante que haverá árbitro de
vídeo nas quartas de final desta edição da Libertadores, afirma que
foi "uma vergonha" o que aconteceu no jogo entre Peñarol e Palmeiras
e adianta a presença de "duas seleções importantes" na Copa América
de 2019.
Em que situação o senhor encontrou a Conmebol?
Eu encontrei uma organização que tinha como fim o dinheiro, e o
futebol como meio. Mas isso mudou. O futebol tem que ser o objetivo
final, e isso tem que gerar dinheiro para os times, os jogadores, as
jogadoras.
A Libertadores mudou de formato e de calendário. Mas há aspectos da
velha Libertadores, como violência, casos de racismo. O que fazer
para mudar?
Temos que fazer muitas coisas. Tem que ter decisões políticas muito
boas, muito pró-ativas e muito fortes. Acabou a impunidade. Essa
cultura das torcidas de ter que mostrar força, mostrar que são
violentos, isso tem que mudar. Tudo começa com uma decisão política.
Tem que envolver os governos, polícia, clubes, dirigentes, tudo tem
que mudar. Estou otimista que isso vai acontecer, mas não no curto
prazo.
Os clubes brasileiros ganham muito mais dinheiro que clubes de
outros países. Há algo que a Conmebol pode fazer para reduzir essa
distância?
O futebol brasileiro faz muito mais dinheiro que a Conmebol. Mas
olhando de perto, o que acontece com a Libertadores a Sul-Americana?
Nosso faturamento está subindo. A arrecadação será muito maior para
o futebol-americano e todos vão ganhar mais.
Como é o plano de voltar a jogar a Copa Intercontinental?
É meu sonho. Eu falei para o presidente [da Uefa, Aleksander]
Ceferin. Ele gostou, os dois presidentes, nós gostamos da idéia.
Agora tem que colocar isso num papel, ver se é possível, se há
capacidade, ver as datas. Queremos que o campeão da Libertadores
jogue contra o campeão da Champions League e o campeão da
Sul-Americana jogue contra o campeão da Liga Europa. Tudo começa com
um sonho.
Isso poderia substituir o Mundial de Clubes?
Não diria isso, porque a própria FIFA não sabe o que fazer com o
Mundial de Clubes. Mas esse jogo entre América do Sul e Europa
sempre gostamos. É uma questão de voltar a fazer o que mundo inteiro
sempre gostou.
Como será a Copa América de 2019 com convidados?
A CBF vai apresentar para a Conmebol as estratégias, os convites. E
agora nós temos duas cartas de seleções muito importantes do mundo
que querem jogar a Copa América. Ainda não convidamos ninguém. Mas
duas se apresentaram.
Quais?
Só vou dizer que são duas.
Copa do Mundo de 2026 deve ser nos EUA. E a China quer a Copa de
2030...
Eu acho que a China não pode, porque é na Ásia, e o Qatar organizou
2022, então não poderia voltar.
Mas essa regra não pode mudar?
É uma boa pergunta. No mundo muda tudo, mas hoje é impossível.
Há chance de a Copa de 2030 ser no Uruguai?
Eu falei para o Gianni (Infantino, presidente da FIFA), falei para
os presidentes das confederações que a Conmebol vai tentar fazer com
que no ano do centenário a Copa volte para o Uruguai. Com a
Argentina junto.
Quando os árbitros de vídeo vão estrear na Libertadores?
Vai acontecer. Eu só disse que "vai acontecer", o "como" é problema
da organização do torneio.
Já nesta edição?
Já. Das quartas de final para a frente. Se você compromete sua
palavra, tem que acontecer. Eu já disse para a minha equipe na
Conmebol: "Eu garanti, agora vocês têm que fazer acontecer". A
Conmebol tem que mostrar que está indo para a frente na tecnologia,
nas mudanças. Temos que recuperar o prestígio perdido.
Os clubes do México voltam para a Libertadores?
Eles nunca falaram sobre sair. Nem falaram de voltar. A Conmebol só
tem informações dos mexicanos através da imprensa. A Libertadores
vai para a frente, agora tem muito mais times. Entre Libertadores e
Sul-Americana são 97 times, isso é muito importante.
Como o senhor viu o que aconteceu entre Peñarol e Palmeiras?
Uma vergonha, uma vergonha. Não justifico a violência, não gosto de
violência. Mas agora é uma decisão política: eu já falei com
governos de Argentina, Uruguai, Colômbia, Brasil, que agora
precisamos de tolerância zero com a violência. Mas isso só vai
acontecer se houver uma decisão política.
Pretende ser presidente da FIFA?
Estou muito contente sendo presidente da Conmebol. Pessoalmente eu
não tinha aspirações de ser presidente da Conmebol. Aconteceu tudo o
que todo mundo sabe, e foi quase um acidente. Eu não tinha
planejado.
Uma investigação interna mostrou que houve desvios de mais de US$
100 milhões. Algo já foi recuperado?
Nada. A Justiça americana já recuperou US$ 300 milhões. Para ter
acesso a algo, a Conmebol tem que ser considerada vítima. Quando eu
assumi, o status da Conmebol na Justiça americana era de organização
mafiosa. Mas isso mudou agora, depois que eu assumi e a colaboração
com a justiça americana começou.
Fonte: GE - Por Martín Fernandez e Felipe Diniz, Manama, Bahrein