Edílson Pereira de Carvalho: "Onde tem
dinheiro, tem corrupção"
Ex-árbitro fala sobre a condenação na Justiça e garante gostar mais de
animais do que de seres
08/03/2011 -
Principal protagonista da Máfia do Apito, responsável pela combinação
de resultados de jogos de futebol no Brasil, o ex-árbitro Edilson
Pereira de Carvalho foi condenado recentemente por seu envolvimento no
esquema.
Ao lado da CBF, o ex-árbitro terá que pagar multa de R$ 160 milhões
pelo envolvimento no esquema de manipulação de resultados em jogos do
Paulista, Brasileiro e Libertadores. E sabe como ele reagiu?
– Não tenho a grana, então não tenho com que me preocupar. Só também
não vou dar risada, não é?! – afirmou Edilson, por telefone.
A Justiça de São
Paulo determinou à FPF, ao ex-juiz Paulo José Danelon e a Nagib Fayad
(empresário que tratou das propinas a favor de apostadoresem loterias
clandestinas na internet) o pagamento de R$ 20 milhões a um fundo
estadual, a título de ressarcimento ao povo. Cabe recurso.
Edilson Pereira de Carvalho é capaz de chocar, mesmo após apanhar feio
da vida.
– Gosto mais dos
animais do que dos seres humanos. Adoro meus poodles. Minha mulher
acha estranho – disse o ex-árbitro, expondo as feridas do isolamento
social depois da Máfia do Apito.
Cerca de seis anos após o escândalo, Edilson diz que pensou em se
matar, fala do processo contra a FPF e dos drinks e petiscos que serve
num clube de Jacareí.
Alê
da Mata comenta sobre a máfia do apito
Confira a
entrevista completa:
LANCENET!: Como você encara a decisão da Justiça paulista?
Edilson Pereira de Carvalho: Ela não cheirou, nem fedeu. O valor
é uma utopia. A CBF e a FPF é que vão se preocupar.
L!: E você considera o valor justo?
E.P.: Para ser sincero, fiquei surpreso. Não sabia nem que
estava correndo algo na Justiça. Nem depus sobre o caso. Se o
valor fosse pequeno, eu teria de tomar uma atitude, com certeza.
L!: Como soube da multa?
E.P.: Fiquei sabendo mesmo pela (revista) “Veja”. O cara me
falou de uma multa, achei que era de carro. Depois, li na
imprensa como a CBF se defendeu. Pegou mal. Ela podia falar que
não tinha nada a ver, que a burrice foi do Edilson ou do Danelon,
dos caras dos sites de apostas. Mas não dizer que o futebol não
significa nada. A entidade ganha milhões com o futebol e o joga
no lixo!
LANCE!: Você ainda guarda raiva da CBF ou da FPF? E.P.: Raiva não. Mas
ainda cobro direitos trabalhistas da FPF, em segunda instância. Os
caras me obrigaram a assinar um termo como autônomo, mas todo dia me
ligavam, convocavam para reunião ou para jogo. Eu era bom, xingava os
jogadores e não distribuía cartões.
Os ídolos das
torcidas ficavam tudo em campo e não tinha circo. Então resolvi pegar
um monte de escalas e outras provas na internet (no site da entidade)
e mandei a ação. Na primeira instância foi julgado rapidamente na
Barra Funda, do lado da FPF. Não deu em nada. Agora está em Brasília.
Meu advogado pede R$ 300 mil. Caso eu ganhe, com certeza os árbitros
vão vir com processo tudo atrás.
L!:
A entidade não chegou a lhe procurar para um acordo?
E.P.: Não, eu fiz a proposta. Mas se topassem acordo sigiloso, me
pedindo para não falar com jornais, aceitaria sem problemas. Mas não.
Nota da Redação: A FPF processou o exaacute;rbitro por danos morais,
que foi condenado a pagar R$ 35 mil. A decisão em 1a instância não
cabe mais recurso. A fase agora é de execução.
LANCE!: Arrependeu-se do envolvimento na Máfia do Apito? E.P.: É
a única coisa que me arrependo. Na época, cheguei a pegar o revólver e
pensar em me matar. Ia dar um tiro na cabeça. Minha esposa chorava no
escritório. E eu trancado em casa. Não o fiz.
L!:
Como sua filha reagiu ao escândalo?
E.P.: Não falamosmuito sobre isso. Ela entendeu. Hoje tem 15 anos.
Sabe que todos têm direito de errar. E não fica de olho virado.
L!:
Não deu certo a adega em Jacareí?
E.P.: Era um comércio de vinhos e peixes, mas são coisas caras. Fiquei
um ano e meio. Nunca teve desentendimento ou chacota.
L!:
Como você se virou para pagar contas depois disso? E.P.:
Na época do escândalo foi com o dinheiro das entrevistas que eu quitei
a casa. Aí veio a adega e fiquei nove meses desempregado. Aí pedi para
ser balconista. Tem de ser humilde. Então vim parar no bar do Trianon,
um clube tradicional em Jacareí. O dono frequentava o meu bar. Não
tenho estudo e com 48 anos não consigo emprego em indústria.
Faço umas batidas,
caipirinhas e porções. Tenho o dom. Antes eram R$ 3,2 mil em um jogo,
agora são três salários no mês. Ainda conto com a ajuda da minha mãe,
que tem umas pensões. Hoje tenho dois carros populares zeros e minha
filha segue em escola da elite de São José dos Campos. Para distrair
jogo buraco e tranca na internet. Outro dia joguei sem querer com o
Luis Fabiano.
NR.: Ao LANCE!, ele
nunca pediu dinheiro para uma entrevista. Diferentemente do "Diário de
S. Paulo", que nada pagou.
L!:
Voltaria a apitar?
E.P.: Não. Tive convites, mas me sinto mal em me vestir de juiz. Só
guardei um apito e dois cartões.Tenho que ter vergonha na cara.