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Janette
Arcanjo na sede da FIFA na Suíça - Crédito: arquivo
pessoal |
Ela é natural de Ipatinga, cerca de
200 km da Capital BH, na rica região do vale do aço em Minas Gerais.
De família de classe media, teve bons ensinamentos e qualidade de
vida proporcionada pelo pai José Agostinho Arcanjo, funcionário
aposentado da Usiminas e pela mãe dona Darcy Eleotéria Arcanjo que
era enfermeira e residem até hoje no interior.
Formada em Letras (Português - Espanhol - licenciatura e
bacharelado) pela UFMG, em 2007, é professora efetiva do estado onde
leciona Espanhol e de Literatura na rede particular. Mora atualmente
em Belo Horizonte, mas esta em processo seletivo para mestrado em
Cuba onde pretende morar no futuro próximo.
Fã de esportes desde criança - jogou vôlei na infância, mas não
seguiu carreira – quis o destino que uma reprovação no vestibular
para direito a aproximasse da arbitragem.
“Eu não passei no vestibular de direito. Aí na minha cidade abriu
um curso de árbitro, eu vi um cartaz na padaria falando que pela
primeira vez ia ser extensivo às mulheres, aí eu resolvi fazer. Eu
gostava de esporte, então era uma forma de estar inserida no meio”
– diz Janette.
Fez seu primeiro curso de árbitro em
2000 pela liga de Ipatinga. No ano seguinte fez pela liga de
Contagem, município da grande BH, passou a fazer parte do quadro de
árbitros da Federação Mineira de Futebol e foi seguindo carreira. Em
2008 estreou na primeira divisão do campeonato mineiro na partida
entre Atlético e Democrata de Sete Lagoas, com Alício Pena Júnior no
apito.
Dois anos depois estreou na Série A do
Brasileiro, no clássico local (Cruzeiro e Atlético) com Paulo César
de Oliveira no apito e Ednilson Corona como outro assistente.
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Em 2011 foi promovida a Aspirante FIFA
e em 2012 passou a integrar o quadro internacional onde permaneceu
até 2015.
A saída da FIFA não foi bem digerida e
aceita por ela justamente quando atingiu o ápice da carreira
participando de uma Copa do Mundo. Revelou ter sido covardia e falta
de transparecia por, após perguntar, sequer saber os motivos.
“Não
fui a primeira e nem serei a última a sofrer injustiças
na arbitragem. Fico triste por aquelas que não chegaram
e |
Com os ursos
no Canadá - arquivo pessoal |
nem
chegarão aonde cheguei, mas que são iludidas, se matam
de tanto treinar, investem caro e não vão ter o prazer
de fazer pelo menos um jogo na série A” – desabafa a
ex-FIFA. |
Janette ainda disse que encerrou a
carreira por ter conseguido atingir o ápice da carreira com a
participação na Copa do Mundo, pelas injustiças sofridas, pelas que
sempre ouvia e via acontecer e para ter vida além da arbitragem.
Essa é Janette Mara Arcanjo, 38 anos (26/07/80), 1,65 m,
ex-assistente FIFA que abaixo fala um pouco mais da sua vida
incluindo família, infância, arbitragem e o que pretende para o
futuro.
Tem irmãos?
Tenho dois: Jefferson (caçula) engenheiro de produção e Graciette (a
do meio) que é advogada.
Como
conciliava o tempo para família, trabalho e arbitragem?
Era difícil. O foco total era arbitragem, então muitos encontros,
datas festivas, estava ausente por conta de treinos, competições,
cursos, etc... Com relação ao trabalho tinha que pagar professor
para me substituir.
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Janette
durante cursos preparatório para competições da FIFA -
Crédito: arquivo pessoal |
Sofreu algum
tipo de preconceito ou assédio de dirigentes da arbitragem,
jogadores, árbitros?
Não, de nenhuma maneira.
Que ano se
formou árbitra, quem foi seu professor?
Primeiro fiz o curso em Ipatinga e cito meu grande amigo Ayres Júlio
que me ajudou bastante. Em Belo Horizonte fiz curso com o professor
Juarez que formou muitos árbitros como Ricardo Marques, por exemplo.
Para atuar
nas principais divisões do futebol brasileiro é obrigatório testes
com índice masculino. Você é uma das poucas que conseguiu isso. Como
eram seus treinamentos e como se sentia nos testes?
Treinava seis dias na semana. Alguns dias levantava muito cedo e
treinava antes de trabalhar. Sempre dava um frio na barriga antes
dos testes, mas era só começar e tudo corria bem.
Atuou em
alguma final?
Sim, a final de 2015 em MG, entre Atlético e Caldense.
Em quem você
se espelhava na arbitragem?
Ana Paula Oliveira.
Você atuou na
Copa do Mundo de Futebol Feminino em 2015 no Canadá, conte como foi.
Experiência incrível, atingi o ápice da minha carreira. È outro
mundo, totalmente diferente do amadorismo na qual o futebol feminino
é tratado na América do Sul como um todo. Você estar com pessoas do
mundo inteiro, partilhar experiências, aprender sobre o outro e sua
cultura é indescritível. Nos vêem além de árbitras, têm a
sensibilidade de ver que ali estão pessoas que estão longe de suas
famílias, em uma cultura diferente e com uma responsabilidade
enorme. Isso fez toda diferença, pois dá mais segurança e
tranqüilidade para trabalhar.
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Janette
fazendo tour em Doha no Catar durante curso preparatório
para Copa - Crédito: arquivo pessoal |
Atuou em
quais torneios internacionais?
Pela Conmebol: Sul-americano Sub-17 (Bolívia), três
libertadores (Foz do Iguaçu, Recife, Medellín) e Copa América no
Equador.
Pela FIFA: Duas Copas Algarve (Portugal), Copa do Mundo
Feminina no Canadá e vários amistosos da seleção brasileira
feminina.
Na sua visão
quais motivos te tiraram do quadro internacional (FIFA)?
Essa é a grande questão. Não te falam o motivo, falta transparência.
Em 2015, voltando de uma Copa do mundo e fazendo uma libertadores
pela primeira vez fora do Brasil te tiram do quadro Internacional!!!
Não entendo, de verdade.
Perguntei ao comandante, na época ele
simplesmente se absteve de me responder. Pode ser que tecnicamente
não estivesse à altura de ser internacional, pode ser que a opção
era outra pessoa, enfim tudo pode ser motivo. Não fui a primeira e
nem serei a última a sofrer injustiças na arbitragem. Fico triste
por aquelas que não chegaram e nem chegarão aonde cheguei, mas que
se matam de tanto treinar, investem caro e não vão ter um prazer de
um jogo na série A. Basta ver as escalas da divisão supracitada e
ver quem trabalha. Muitas passam no teste.
Você tinha um
sonho que não se realizou, participar da Rio 2016. Se sente
frustrada por não ter atingido objetivo?
Não sinto porque foi algo que não dependeu de mim. Estaria se
tivesse falhado em alguma fase do processo seletivo. Quem estava e
tinha o poder não me quis mais como FIFA, então não iria às
Olimpíadas. Não me sinto frustrada de forma alguma.
Quais foram
os motivos pelo qual encerrou a carreira?
Primeiro foi à vontade de ter vida além da arbitragem, família,
amigos e relacionamento. Segundo foi que consegui atingir o ápice da
carreira que era a Copa do Mundo. Terceiro fui vítima da injustiça
que sempre ouvia e via que acontecia. Outra questão, com todo
respeito a quem pertenceu ao quadro Internacional e optou por
continuar, é não ser mais escalado na série A. NENHUMA "ex-FIFA"
atua ou atuou na série A depois que perdeu a insígnia, mesmo
passando em teste masculino. Então se pressupõe que não possui
qualidade técnica para jogos desse porte e vou me matar de treinar,
investir caro em equipamentos, nutricionistas, médicos especialistas
para fazer a cada dois meses uma série B? Basta ver as escalas da
divisão supracitada e ver quem trabalha, apenas duas.
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Janette
durante Copa do Mundo Feminino no Canadá - Crédito:
Getty images |
Não dependo da arbitragem para viver,
não iria me sujeitar a isso. Ganhei muito dinheiro sim, comprei
minha casa com a arbitragem, sou gratíssima por isso, foi
maravilhoso enquanto durou, só não terminou da forma que havia
planejado e me preparado.
Hoje tenho vida, dou aula para alunos que alguns não têm nem terão
as oportunidades. Então minha missão como educadora é dar sentido à
vida deles e tem dado certo. Isso é viver.
Defina pra
você o que é ser um árbitro de futebol.
Viver o presente. É se abster de tudo e focar naquilo que ama e está
disposto a fazer. É ter prazer em se dedicar para mostrar o seu
melhor e dizer que valeu a pena.
No ano
passado você participou de um congresso feminino na Bahia onde foi
palestrante. Seu ciclo na arbitragem terminou ou ainda esta aberta
para convites para algum tipo de trabalho tipo instrução, orientação
de árbitros?
Foi muito bom o Congresso, experiência maravilhosa, embora já esteja
acostumada uma vez que ministro aulas de expressão oral e escrita no
curso de formação de árbitros na FMF e leciono em escolas. Ciclos
nunca se acabam, se transformam de acordo com o contexto e
oportunidades. Estou sempre disponível para aquilo que for para
somar e agregar valores.
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Janette
atuando pela 2ª divisão do Mineiro com Elmivan Alves
Andrade e Rodrigo Otávio Baeta - Crédito: Victor
Minhoto/Jogos Perdidos |
O que ele disse
Como foi citado, procuramos Sérgio Corrêa, então presidente da
Comissão Nacional de Arbitragem da CBF em 2015. Questionado sobre os
motivos da saída da assistente do quadro da FIFA Sérgio disse que:
“Todas as decisões sobre árbitros que são indicados ou que deixam
de ser para a Senaf pelas comissões seguem a mesma linha da CBF em
relação aos indicados para lista FIFA. Não comentamos pela mídia
quando são indicados e nem quando deixam de pertencer ao respectivo
quadro. Em resumo, a renovação ou não é feita anualmente com base em
aspectos técnicos, perspectivas de aproveitamento, físicos, mentais
e sociais!” – falou Corrêa.