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 30/11/2018    14:01hs

Ex-assistente encerrou a carreira por ter sido retirada de forma covarde da FIFA

Internacional entre 2012 e 2015, Janette Arcanjo aponta falta de transparência e afirma não ter sido a primeira e nem a última a sofrer injustiças na arbitragem

Janette Arcanjo na sede da FIFA na Suíça - Crédito: arquivo pessoal
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Ela é natural de Ipatinga, cerca de 200 km da Capital BH, na rica região do vale do aço em Minas Gerais. De família de classe media, teve bons ensinamentos e qualidade de vida proporcionada pelo pai José Agostinho Arcanjo, funcionário aposentado da Usiminas e pela mãe dona Darcy Eleotéria Arcanjo que era enfermeira e residem até hoje no interior.

Formada em Letras (Português - Espanhol - licenciatura e bacharelado) pela UFMG, em 2007, é professora efetiva do estado onde leciona Espanhol e de Literatura na rede particular. Mora atualmente em Belo Horizonte, mas esta em processo seletivo para mestrado em Cuba onde pretende morar no futuro próximo.

Fã de esportes desde criança - jogou vôlei na infância, mas não seguiu carreira – quis o destino que uma reprovação no vestibular para direito a aproximasse da arbitragem.

“Eu não passei no vestibular de direito. Aí na minha cidade abriu um curso de árbitro, eu vi um cartaz na padaria falando que pela primeira vez ia ser extensivo às mulheres, aí eu resolvi fazer. Eu gostava de esporte, então era uma forma de estar inserida no meio” – diz Janette.

Fez seu primeiro curso de árbitro em 2000 pela liga de Ipatinga. No ano seguinte fez pela liga de Contagem, município da grande BH, passou a fazer parte do quadro de árbitros da Federação Mineira de Futebol e foi seguindo carreira. Em 2008 estreou na primeira divisão do campeonato mineiro na partida entre Atlético e Democrata de Sete Lagoas, com Alício Pena Júnior no apito.

Dois anos depois estreou na Série A do Brasileiro, no clássico local (Cruzeiro e Atlético) com Paulo César de Oliveira no apito e Ednilson Corona como outro assistente.

 

Em 2011 foi promovida a Aspirante FIFA e em 2012 passou a integrar o quadro internacional onde permaneceu até 2015.

A saída da FIFA não foi bem digerida e aceita por ela justamente quando atingiu o ápice da carreira participando de uma Copa do Mundo. Revelou ter sido covardia e falta de transparecia por, após perguntar, sequer saber os motivos.

“Não fui a primeira e nem serei a última a sofrer injustiças na arbitragem. Fico triste por aquelas que não chegaram e

Com os ursos no Canadá - arquivo pessoal

nem chegarão aonde cheguei, mas que são iludidas, se matam de tanto treinar, investem caro e não vão ter o prazer de fazer pelo menos um jogo na série A” – desabafa a ex-FIFA.

Janette ainda disse que encerrou a carreira por ter conseguido atingir o ápice da carreira com a participação na Copa do Mundo, pelas injustiças sofridas, pelas que sempre ouvia e via acontecer e para ter vida além da arbitragem.

Essa é Janette Mara Arcanjo, 38 anos (26/07/80), 1,65 m, ex-assistente FIFA que abaixo fala um pouco mais da sua vida incluindo família, infância, arbitragem e o que pretende para o futuro.

Tem irmãos?
Tenho dois: Jefferson (caçula) engenheiro de produção e Graciette (a do meio) que é advogada.

Como conciliava o tempo para família, trabalho e arbitragem?
Era difícil. O foco total era arbitragem, então muitos encontros, datas festivas, estava ausente por conta de treinos, competições, cursos, etc... Com relação ao trabalho tinha que pagar professor para me substituir.

Janette durante cursos preparatório para competições da FIFA - Crédito: arquivo pessoal

Sofreu algum tipo de preconceito ou assédio de dirigentes da arbitragem, jogadores, árbitros?
Não, de nenhuma maneira.

Que ano se formou árbitra, quem foi seu professor?
Primeiro fiz o curso em Ipatinga e cito meu grande amigo Ayres Júlio que me ajudou bastante. Em Belo Horizonte fiz curso com o professor Juarez que formou muitos árbitros como Ricardo Marques, por exemplo.

Para atuar nas principais divisões do futebol brasileiro é obrigatório testes com índice masculino. Você é uma das poucas que conseguiu isso. Como eram seus treinamentos e como se sentia nos testes?
Treinava seis dias na semana. Alguns dias levantava muito cedo e treinava antes de trabalhar. Sempre dava um frio na barriga antes dos testes, mas era só começar e tudo corria bem.

Atuou em alguma final?
Sim, a final de 2015 em MG, entre Atlético e Caldense.

Em quem você se espelhava na arbitragem?
Ana Paula Oliveira.

Você atuou na Copa do Mundo de Futebol Feminino em 2015 no Canadá, conte como foi.
Experiência incrível, atingi o ápice da minha carreira. È outro mundo, totalmente diferente do amadorismo na qual o futebol feminino é tratado na América do Sul como um todo. Você estar com pessoas do mundo inteiro, partilhar experiências, aprender sobre o outro e sua cultura é indescritível. Nos vêem além de árbitras, têm a sensibilidade de ver que ali estão pessoas que estão longe de suas famílias, em uma cultura diferente e com uma responsabilidade enorme. Isso fez toda diferença, pois dá mais segurança e tranqüilidade para trabalhar.

Janette fazendo tour em Doha no Catar durante curso preparatório para Copa - Crédito: arquivo pessoal

Atuou em quais torneios internacionais?
Pela Conmebol: Sul-americano Sub-17 (Bolívia), três libertadores (Foz do Iguaçu, Recife, Medellín) e Copa América no Equador.
Pela FIFA: Duas Copas Algarve (Portugal), Copa do Mundo Feminina no Canadá e vários amistosos da seleção brasileira feminina.

Na sua visão quais motivos te tiraram do quadro internacional (FIFA)?
Essa é a grande questão. Não te falam o motivo, falta transparência. Em 2015, voltando de uma Copa do mundo e fazendo uma libertadores pela primeira vez fora do Brasil te tiram do quadro Internacional!!! Não entendo, de verdade.

Perguntei ao comandante, na época ele simplesmente se absteve de me responder. Pode ser que tecnicamente não estivesse à altura de ser internacional, pode ser que a opção era outra pessoa, enfim tudo pode ser motivo. Não fui a primeira e nem serei a última a sofrer injustiças na arbitragem. Fico triste por aquelas que não chegaram e nem chegarão aonde cheguei, mas que se matam de tanto treinar, investem caro e não vão ter um prazer de um jogo na série A. Basta ver as escalas da divisão supracitada e ver quem trabalha. Muitas passam no teste.

Você tinha um sonho que não se realizou, participar da Rio 2016. Se sente frustrada por não ter atingido objetivo?
Não sinto porque foi algo que não dependeu de mim. Estaria se tivesse falhado em alguma fase do processo seletivo. Quem estava e tinha o poder não me quis mais como FIFA, então não iria às Olimpíadas. Não me sinto frustrada de forma alguma.

Quais foram os motivos pelo qual encerrou a carreira?
Primeiro foi à vontade de ter vida além da arbitragem, família, amigos e relacionamento. Segundo foi que consegui atingir o ápice da carreira que era a Copa do Mundo. Terceiro fui vítima da injustiça que sempre ouvia e via que acontecia. Outra questão, com todo respeito a quem pertenceu ao quadro Internacional e optou por continuar, é não ser mais escalado na série A. NENHUMA "ex-FIFA" atua ou atuou na série A depois que perdeu a insígnia, mesmo passando em teste masculino. Então se pressupõe que não possui qualidade técnica para jogos desse porte e vou me matar de treinar, investir caro em equipamentos, nutricionistas, médicos especialistas para fazer a cada dois meses uma série B? Basta ver as escalas da divisão supracitada e ver quem trabalha, apenas duas.

Janette durante Copa do Mundo Feminino no Canadá - Crédito: Getty images

Não dependo da arbitragem para viver, não iria me sujeitar a isso. Ganhei muito dinheiro sim, comprei minha casa com a arbitragem, sou gratíssima por isso, foi maravilhoso enquanto durou, só não terminou da forma que havia planejado e me preparado.

Hoje tenho vida, dou aula para alunos que alguns não têm nem terão as oportunidades. Então minha missão como educadora é dar sentido à vida deles e tem dado certo. Isso é viver.

Defina pra você o que é ser um árbitro de futebol.
Viver o presente. É se abster de tudo e focar naquilo que ama e está disposto a fazer. É ter prazer em se dedicar para mostrar o seu melhor e dizer que valeu a pena.

No ano passado você participou de um congresso feminino na Bahia onde foi palestrante. Seu ciclo na arbitragem terminou ou ainda esta aberta para convites para algum tipo de trabalho tipo instrução, orientação de árbitros?
Foi muito bom o Congresso, experiência maravilhosa, embora já esteja acostumada uma vez que ministro aulas de expressão oral e escrita no curso de formação de árbitros na FMF e leciono em escolas. Ciclos nunca se acabam, se transformam de acordo com o contexto e oportunidades. Estou sempre disponível para aquilo que for para somar e agregar valores.

Janette atuando pela 2ª divisão do Mineiro com Elmivan Alves Andrade e Rodrigo Otávio Baeta - Crédito: Victor Minhoto/Jogos Perdidos

O que ele disse

Como foi citado, procuramos Sérgio Corrêa, então presidente da Comissão Nacional de Arbitragem da CBF em 2015. Questionado sobre os motivos da saída da assistente do quadro da FIFA Sérgio disse que:

“Todas as decisões sobre árbitros que são indicados ou que deixam de ser para a Senaf pelas comissões seguem a mesma linha da CBF em relação aos indicados para lista FIFA. Não comentamos pela mídia quando são indicados e nem quando deixam de pertencer ao respectivo quadro. Em resumo, a renovação ou não é feita anualmente com base em aspectos técnicos, perspectivas de aproveitamento, físicos, mentais e sociais!” – falou Corrêa.

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