O inglês Howard Webb é um
homem comum. Tranqüilo aos seus 44 anos, sorri e responde a tudo sem
rodeios. Tanto, que custa acreditar que é a mesma pessoa que apitou
a final da Copa do Mundo da FIFA África do Sul 2010 entre Espanha e
Holanda. Pois, sim, é ele. "Aquele jogo mudou a minha vida por
completo", reconhece na conversa que teve com o FIFA.com. No próximo
mês de junho, ele estará de novo em um Mundial – agora, no Brasil.
Pai de três filhos
adolescentes que, segundo ele, não demonstram muito, mas devem estar
orgulhosos do seu trabalho, Webb passou pela sede da FIFA, em
Zurique, na Suíça, para participar do seminário dirigido aos
árbitros que apitarão na próxima Copa do Mundo. Aproveitando a
oportunidade, o FIFA.com conversou com ele sobre vários assuntos: o
seu início na profissão, as lembranças daquela fria noite em
Johanesburgo e a difícil escolha que ele e todos os colegas terão
que fazer durante a próxima competição: quem ele quer que vá mais
longe, a sua seleção ou o seu trio de arbitragem?
FIFA: Como nasceu a paixão pela arbitragem? A maioria das
crianças sonha em ser jogador de futebol, mas não muitos se animam
com a idéia de apitar...
Webb: Eu também sonhava
em ser jogador! Se você falar com qualquer árbitro aqui, todos dirão
que o futebol é a paixão deles. Por isso fazemos este trabalho. É
verdade que os meninos sonham em ser jogadores, mas nós não somos
diferentes. Tentei chegar lá, trabalhei muito, mas simplesmente não
tinha o talento necessário para conseguir.
FIFA: Em qual posição?
Webb: Eu era zagueiro
central, por ser grande. Tinha uma boa visão de jogo, mas nunca fui
muito bem no jogo aéreo... Acho que não era suficientemente bom.
Pessoalmente, acreditava que os juízes eram homens velhos e carecas
e por isso não me convencia de seguir essa profissão quando meu pai
(um árbitro semiprofissional) me propôs isso. Pensei: "Não, não...
Não é para mim". Pensando bem, talvez seja como os garotos de agora
me vêem! (Risos). Mas ele me incentivou, e quando eu tinha 17 anos,
decidi tentar junto de um amigo da escola. Essa decisão acabou me
levando à final da Copa do Mundo de 2010. Talvez de um jeito
diferente do que eu tinha imaginado, mas me deu a possibilidade de
chegar lá. Viajei por 44 países, cinco continentes... É incrível!
Valeu a pena.
FIFA: Quer dizer então que você recomenda?
Webb: Claro, qualquer
pessoa que sentir paixão por este esporte deve considerar isso como
uma oportunidade. Nem todos têm o talento natural para chegar ao
ponto mais alto, mas se tiverem a atitude e o esforço necessários,
se adorarem este esporte, poderão encontrar uma alternativa para
chegar lá.
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Howard Webb (ao lado
dos assistentes Mike Mullarkey e Darren Cann) foi o
primeiro árbitro inglês a apitar uma final de Copa do
Mundo desde 1974. |
FIFA: Como era a
relação do Howard Webb jogador com os árbitros?
Webb: Costumava fazer o
meu papel. Às vezes me pergunto como os jogadores conseguem opinar
sobre a minha atuação quanto precisam estar tão concentrados no seu
futebol. Sempre tive muito respeito pelos árbitros. Mas sabe de uma
coisa? Até hoje, a relação que existe entre os jogadores e nós é
muito boa. Eles confiam nos árbitros mais experientes porque os
conhecem, já jogaram com eles várias vezes e entendem que às vezes
cometemos erros. Isso também faz parte do jogo.
FIFA: Se você tivesse que destacar uma coisa positiva e outra
negativa do trabalho de árbitro, quais seriam?
Webb: O positivo é que
estamos no melhor lugar para curtir o show, este esporte que
adoramos. Não falamos muito nisso, mas é verdade: enquanto as
pessoas compram um ingresso para assistir a um jogo, eu não pago...
Simplesmente vou! É claro que trabalho duro para conseguir isso, mas
tenho o melhor lugar para assistir. Já a pior parte é conviver com
os erros, que são uma coisa inevitável. É difícil, sabe? A última
coisa que eu quero é que as pessoas pensem que só apitamos o jogo,
pegamos o avião de volta para casa e pensamos: "Pronto, acabou".
Cada vez que cometemos um erro é doloroso, tem um impacto no destino
de um time, de um jogador ou um técnico, e até mesmo na nossa
reputação.
FIFA: Não tem torcida pelo árbitro e ele só sai no jornal se
cometeu um erro. É preciso uma personalidade especial para essa
função?
Webb: Sim, é verdade.
Outro dia li uma reportagem sobre um jogo que apitei. No fim, punham
o meu nome e uma avaliação. Só duas palavras: "anonimamente
competente". Pensei: "Perfeito". É o que todos queremos ser como
árbitros: competentes de forma anônima. Mas o jogo nem sempre
acontece de um jeito em que podamos nos manter anônimos. Às vezes
você precisa aparecer. Por isso, é uma satisfação enorme sair do
estádio sabendo que não teve complicação. Você volta para casa se
sentindo o máximo. Mesmo se ninguém falar, você sabe que contribuiu.
FIFA: E quanto à final entre Espanha e Holanda na África do
Sul? Qual é maior lembrança daquela noite em Johanesburgo?
Webb: É a de caminhar
em direção ao gramado, pegar aquela (bola) Jabulani dourada e passar
ao lado da taça da Copa do Mundo. Já a tinha visto muitas vezes na
minha vida, na TV ou as réplicas, mas estar diante da verdadeira...
É a peça de metal mais brilhante que já vi na minha vida! Uma
estátua de ouro com o mundo em cima, aquela base verde... É
incrível.
FIFA: Dava vontade de erguê-la?
Webb: Sim! (Risos).
Seria o meu sonho fazer isso como capitão um dia. É uma grande honra
ter podido estar lá. É só falar disso que os meus pelos – não os da
cabeça, que aí não tenho, mas os da nuca – se arrepiam. Foi
fantástico. Aquela final mudou a minha vida em todos os sentidos.
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Yuichi Nishimura (JPN), Darren Cann, Howard Webb, Mike
Mullarkey (ENG) e Toru Sagara (JPN) recebem medalhas por
terem atuados na final da Copa do Mundo de 2010. |
FIFA: Quantas vezes
você voltou a vê-la?
Webb: Quer saber? Uma.
Uma única. E esperei um mês para fazer isso. Chamei um amigo em casa
e vimos o jogo inteiro. Queria guardá-lo na memória, pelo que aquele
momento representou. Por isso não vi mais. Foi um jogo difícil, mas
acho que foi melhor do que eu senti enquanto ele estava acontecendo.
Eu estava muito concentrado no trabalho naquela noite. Agora, guardo
aquilo na minha cabeça e no meu coração.
FIFA: Você deve ter
muitas histórias daquela noite. Pode contar alguma, agora que já
passou tanto tempo?
Webb: Tenho várias,
claro... (Pensa). Eu me lembro de estar saindo de campo para
procurar o meu pai, que estava na arquibancada. Foi ele quem me
iniciou neste caminho... Ele estava com uma bandeira da Inglaterra e
me disse: "Você não sabe jogar, mas sabe apitar". Foi demais! (Solta
uma gargalhada).