Até por orientação da Federação, um
árbitro não pode falar”, explica Jeimes, 33 anos, de Araras.
A declaração ajuda a entender as
denúncias de Gutemberg.
Criticado por não
ter falado quando pertencia ao quadro da FIFA, o ex-árbitro promete
divulgar em breve as provas que diz estar apresentado sigilosamente à
Justiça desde 2007.
“Os árbitros não querem se comprometer
com os dirigentes. Todo mundo vive a expectativa de chegar ao topo da
carreira. Por isso existe esse silêncio”, afirma Davi, 29 anos, na FPF
desde 2006.
Dia 2 de outubro, ele foi escalado para
jogo do campeonato amador de São Paulo, em Brodowsky (Brodowsky x Sem
Segredo).
Alegando problemas financeiros, já que
pagaria para trabalhar, pediu dispensa. Por conta de uma pancadaria
generalizada o jogo, que acabou sendo apitado por Gustavo Turra,
terminou no 1º tempo, de acordo com súmula no site da Federação.
Junto com a partida, terminou também a
carreira de Davi.
Árbitros dizem que só crescem na
arbitragem paulista se apitarem jogos de séries inferiores em que até
perdem dinheiro.
Em novembro, ele saiu de Campinas para
reunião na capital com Arthur Alves Junior, um dos diretores da
arbitragem e braço direito do Coronel Marinho, chefe da comissão.
Em pauta, a razão de seu desligamento.
“Fiz os cálculos e vi que o dinheiro que receberia (R$ 188) mal dava
para pagar o deslocamento e a alimentação”, diz ele, que andaria, em
um dia, 500 km, ida e volta — isso se economizasse na diária de um
hotel. Só de gasolina e pedágio, saindo de Campinas, ele gastaria R$
200.
No encontro, Davi recebeu uma
recomendação de Arthur. “Ele disse: ‘Faça uma carta para o Coronel
Marinho se humilhando. Vai dar tudo certo. Mas quero deixar claro que
seu caso vai servir de exemplo para os demais. Quero você falando bem
de mim depois”. Pensando em preservar anos de investimento e trabalho,
fez o combinado. O retorno ao quadro, no entanto, nunca aconteceu e
ele decidiu fazer a denúncia.
“Os responsáveis pela arbitragem ganham
as licitações de campeonatos amadores e a gente tem que se virar para
trabalhar. Mas aí você nega e eles te desligam do sistema. Te colocam
na parede para servir de exemplo aos colegas. É assim que funciona”,
finaliza. Jeimes concorda: “É um jogo, mas não dá para entender os
critérios”.
CENTRALIZAÇÃO: Chefe do apito
tem presença forte em quatro órgãos
“Em quem nós podemos confiar? Vamos
reclamar para quem?”. A indagação de Davi está pautada na hierarquia
das entidades que comandam a arbitragem paulista. Segundo os árbitros,
as entidades são administradas pelas mesmas pessoas.
“O Arthur (Alves Junior) é responsável
pela escala dos árbitros da FPF, é o presidente do Sindicato dos
Árbitros (Safesp) e tesoureiro da Cooperativa dos Árbitros (Coafesp).
Você fala de um lado, o outro escuta”, pondera Jeimes.
Sucessor de Sérgio Corrêa na
presidência do Sindicato dos Árbitros, Arthur também ocupa a cadeira
de Secretário Geral da Associação Nacional dos Árbitros (Anaf).
“Tem muita coisa errada. Desde a
metodologia aplicada aos árbitros no ranking, até o acúmulo de cargos
com motivação política de alguns diretores do apito”, pondera
ex-árbitro Rafael Porcari, que há anos mantém um blog no qual debate
sobre as irregularidades do meio.
OUTRO LADO: Dirigente nega
conflito
A reportagem entrou em contato com
Arthur Alves Júnior, principal alvo das acusações, que garantiu não
existir conflito (ou convergência) de interesses no acúmulo de suas
funções. “Não prejudico ninguém.
O Sindicato dos Árbitros existe porque
a Federação dá um apoio. Se isso não acontecer, o sindicato já teria
fechado. O dia que eu me sentir em uma posição conflitante, aí vou
sair da comissão de arbitragem (da FPF)”, disse ele, que em seguida
completou:
“Como presidente do Sindicato dos
Árbitros, tenho conseguido fazer muito mais coisas dentro da comissão
de arbitragem do que antes. O processo funciona com transparência”.
Na presidência do Sindicato dos
Árbitros, Arthur é o sucessor de Sérgio Corrêa, atual chefe da
comissão de arbitragem da CBF, e acusado de corrupção e favorecimento
por Gutemberg de Paula Fonseca em declarações à rádio ‘Jovem Pan’ na
semana passada.
Por DANIEL CARMONA - Do “MARCA”